Eu não morri.
Esse texto poderia parar por aqui, porque afinal, não ter morrido é bacana pra chuchu e tudo o mais que eu disser vai parecer irrelevante depois disso. Mas, para que ninguém me acuse de ser excessivamente dramática, explico: em 2024, eu passei pela minha primeira cirurgia da vida. Retirei um teratoma do ovário esquerdo, um endometrioma do direito e um foco de endometriose de algum lugar que já não me recordo. Para alguém que nunca havia retirado um siso nem tomado um pontinho na infância, não há nada que dê mais perspectiva na vida do que uma anestesia geral.
Lembro que, a caminho do hospital, “eu pensava: e se eu morrer na cirurgia? Não escrevi um filho, não plantei um livro, não tive uma árvore” (eram 4h da manhã, os pensamentos estavam confusos, respeitem). Dei instruções ao meu marido e algumas incluíam até mesmo encontrar uma nova esposa depois que eu fizesse a passagem. Mas no geral, cheguei à conclusão de que a vida até ali não tinha sido ruim, não. Casei com um cara legal, fiz amigos incríveis e, apesar de algumas maledicências eventuais, se algo desse errado na cirurgia, eu tinha o pressentimento que meus atos até ali me levariam para cima, e não para baixo, supondo que Paraíso e Inferno de fato existam.
Eu ainda estava pensando nisso tudo quando a enfermeira me deu um comprimidinho mágico-coisa-linda-de-Deus, que me fez dormir durante horas até depois da cirurgia. Acordei perfeita, sem as perebas no útero, com cicatrizes mínimas e a certeza de que a vida é curta. Se nós temos um tempo finito sobre a Terra, nem lascando que eu vou gastar o meu com gente chata.
Esse pensamento - tão profundo quanto um pires, porém ainda absurdamente real - moldou a forma como eu decidi conduzir meu ano. Trabalhos à parte (afinal, boletos são soberanos), em 2024 eu fiz o que eu quis. Li o que me deu vontade, estudei o que faz meu olho brilhar, doei meu tempo para causas que me tocam o coração, saí de casa para encontrar quem realmente eu estava afim. Fiz terapia (muita!), cavuquei boa parte dos meus medos, traumas e inseguranças para não precisar arrastar essas correntes além do necessário.
Chorei, óbvio, porque ninguém é de ferro e a vida não acontece sempre do jeito que a gente quer. Mas até nos momentos mais difíceis, consegui me manter fiel a mim mesma, aos meus desejos e aos meus valores. Pois taí. Em meio a todos os nossos votos de fim de ano - para nós e para os outros - fica aqui um muito sincero: que em 2025 você não abra mão da auto honestidade, auto gentileza e autoaceitação. Para além das rotinas de skincare, e do que quer que a internet esteja chamando de autocuidado naquele mês, que a gente aprenda a respeitar as nossas vontades.
Deixo aqui um trecho de Desiderata, uma das minhas orações favoritas independente de religião:
“Para lá de uma disciplina sadia, sede ternos convosco mesmos. Sois filhos do universo, tanto quanto as árvores e as estrelas: Tendes o direito de estar aqui…
E, percebais ou não, o universo se desenrola sem dúvida como deveria. Estai em paz com Deus, qualquer que seja vossa concepção dele e, quaisquer que sejam vossas obras e vossos sonhos, guardai no desconcerto ruidoso da vida a paz em vossa alma. Com todas as suas perfídias, as suas tarefas fastidiosas e os seus sonhos desfeitos, o mundo é belo! Prestai atenção…
Tratai de ser felizes.”
Que em 2025 nós sejamos ridiculamente felizes! Feliz ano novo!
Curtinhas!
Me encantou esse texto sobre presença da Ludmilla.
A pilha de cadernos de Austin Kleon me faz acreditar que um mundo com menos telas é possível.
Essa edição da EYN traz uma retrospectiva dos convidados que passaram pela newsletter e eu já estou maratonando.
A gente é feito de pó de estrela (e como essa minha amiga escreve bonito, gente!)
New Plan Journal, uma das newsletters mais bacanas dessa internet, criou uma biblioteca de links no Notion. Presentão de ano novo!
A lista dos melhores livros do ano, segundo a QuatroCincoUm.
Rituais de prosperidade para 2025.
O que eu estou lendo?
Quem me segue no instagram (e se ainda não segue, é só clicar aqui), deve ter visto que eu pedi dicas de livros curtinhos para ler antes de o ano acabar. Entre várias indicações boas (tem post no feed, mas deixo aqui também), fui rebelde e escolhi a entrevista completa da Susan Sontag para a Rolling Stone. Terminarei antes de 2024? Provavelmente não. Mas pelo menos já começo o novo ano com uma mulher inspiradora.
E não custa lembrar: os livros que eu cito aqui nessa newsletter sempre vêm acompanhados de um link de afiliado da Amazon. Ao comprar qualquer item através desses links, eu ganho uma pequena porcentagem e você não paga nada mais por isso. Vamos ajudar essa produtora de conteúdo a adquirir mais livros e falar mais sobre eles, em um ciclo sem fim de bons conteúdos na internet? :)
Amei o texto. É leve, engraçado, prendeu do início ao fim e que mensagem legal!
Obrigada pela recomendação. Feliz ano novo, amiga!