Percebi que, nos últimos meses (quiçá anos), tenho encarado a vida como uma luta. Luta pelo reconhecimento profissional, luta por uma segurança financeira, luta por uma casa que eu goste, luta para encontrar uma pessoa com quem dividir… a luta! Sempre fui entusiasta da ideia de batalhar pelo que a gente quer, mas cada vez mais tenho me perguntado: será que a gente não consegue descrever a vida sem recorrer aos termos bélicos?
Com exceção da pessoa com quem dividir todo esse rolê, ainda não atingi (olha aí mais uma palavrinha com cara de guerra) plenamente nenhuma dessas coisas. O apartamento é lindo, mas não é meu, a segurança financeira é nula e ando planejando uma possível transição de carreira, quem sabe? É tudo um processo.
Claro, isso não quer dizer que eu não possa aproveitar a jornada. Ou, pelo menos, é isso que minha psicóloga tenta me ensinar. E eu venho aprendendo mais e mais a cada sessão. Mas a bem da verdade, duas coisas aceleraram meu aprendizado. Uma muito particular, outra coletiva (até demais).
No final de abril, fiz uma cirurgia para retirar cistos no ovário, um teratoma e endometriose. Por mais que eu estivesse calma e super confiante na equipe médica que eu escolhi, não adianta, uma ida ao hospital sempre trás aquele “e se?”. E se eu não voltar? Bom, se eu não voltar, tô legal com o que construí. Não plantei uma árvore, mas botei fé naquele feijãozinho no algodão da primeira série. Não escrevi um livro, mas escrevo essa newsletter toda semana, deve contar para alguma coisa. Não tive filhos humanos, mas tive caninos. Não tá perfeito, mas vamos com o que temos. O medo, graças à Deusa, foi infundado. Saí da cirurgia plena, a recuperação foi ótima e já estou aqui pronta para “lutar” mais um pouco.
O outro fator acelerador nunca deveria ter existido. Ver o Rio Grande do Sul debaixo d’água mexeu com todos nós - ou pelo menos com quem estava prestando atenção. O Brasil como a gente conhecia deixou de existir, vai demorar muito tempo até que a situação se normalize, e infelizmente, tragédias como essa vão passar a acontecer com uma frequência impressionante. Se ficou comprovado que o caos climático existe, se não dá mais para negar uma realidade óbvia e se o tempo que temos sobre essa Terra é finito, eu vou viver o resto da minha vida em guerra, lutando pelas coisas que disseram que eu deveria querer? Nem f*dendo!
Assim como rever nossos hábitos de consumo, escolher melhor nossos candidatos e ajudar o próximo sempre que possível, a arte da pausa também se faz necessária. Ler ao ar livre, andar descalça na grama, comer sua sobremesa preferida sem pensar no peso, tomar um vinho com as amigas, cantar no chuveiro, dar um mergulho no mar, uma corrida, fazer um date com o marido. Aprender algo novo só pelo puro prazer de aprender, sem pensar nas aplicações práticas. Dormir à tarde, ficar de preguiça aos domingos, praticar o nadismo. Não sei, insira aqui as coisas que você ama fazer.
No número 250 da maravilhosa
, a faz o favor de me apontar o óbvio que eu ainda não tinha percebido: “já faz anos que morreu dentro de mim a ilusão de abrir um buraco no espaço-tempo para fazer tudo que quero sem ser perturbada pelo resto. Trabalhar faz parte da vida e a vida faz parte da arte. O processo será sempre tumultuado (...)”.Se esse tumulto faz parte da vida, não vai existir uma fase, num futuro beeeeeem distante, em que estaremos aptas a fazer absolutamente nada, certo? Sempre teremos papeis a cumprir, como mães, esposas, namoradas, amigas, seres que habitam esse mundo. O tempo para ler, escrever, deitar à beira da piscina sempre vai ser entrecortado com outras tantas coisas menos divertidas. Então, para que correr? Se conseguimos abraçar o tumulto, bem que poderíamos abraçar a ideia de rechear a vida com pequenos prazeres, certo?
Então, f*da-se a luta!
Curtinhas!
“Dona de casa encontra tempo para escrever contos” (e ganhar o Nobel). Que falta vai fazer Alice Munro.
O que estamos sentindo tem nome: ansiedade climática.
Os filmes de herói acabaram com o sexo no cinema. Só não sei se isso é bom ou ruim.
TradWife: trend ou surto coletivo?
Uma mulher, o novo livro da Anne Ernaux.
Um lembrete.
Fique do seu tamanho.
O que eu estou lendo?
Além de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, que comentei na última news, consegui comprar “O Auto da Compadecida” a um preço razoável nessa Book Friday. Não que Ariano Suassuna não valha o que cobram, mas livros bons impressos em folhas brancas e vendidos a um preço exorbitante sempre me deixam triste. De qualquer forma, aproveitei a promo, garanti o meu e já comecei a reler. Estava com saudades de João Grilo e Chicó!
Chega de lutar, bora viver!
AMEI MUITO!
fui lendo e adorando e aí me deparei com a menção à news <3
gosto tanto de te ler!