Na vida real, eu sou a favor da comunicação clara, sem rodeios. Já na ficção… eu sou totalmente partidária das metáforas, das imagens que nos fazem viajar. Gosto quando o autor não subestima minha inteligência, quando não me explica tudo, quando permite que eu tire minhas próprias conclusões.
Não à toa, a leitura de Brodeck’s Report foi um presente. Escrito pelo escritor e roteirista Phillipe Claudel e publicado em 2007, o livro nunca ganhou tradução por aqui. O que temos à disposição é apenas uma adaptação para quadrinhos publicada pela editora Pipoca & Nanquim. Mas, se você lê em francês ou em inglês, fica a minha fortíssima recomendação.
A história é contada sob a perspectiva de Brodeck, um homem que vive em uma pequena aldeia entre as montanhas, na fronteira da França com a Alemanha. Logo após a Segunda Guerra Mundial, ele é encarregado de escrever um relatório sobre o assassinato de um estranho que chega ao vilarejo. Mais do que isso, não digo. Parte da experiência está em montar as peças desse quebra-cabeça.
E se você revirou os olhos e pensou: “olha aí, mais uma história de guerra”, preciso te dizer que esse livro passa longe dos clichês. Na verdade, uma rápida folheada na livraria não daria pistas sobre o contexto histórico. Palavras como “nazismo”, “judeu” ou “extermínio” não aparecem no texto. E é aí que mora a força dessa narrativa.
As imagens que Claudel cria são vívidas, mas poéticas. Melancólicas e, ao mesmo tempo, incrivelmente bonitas. Densas, sufocantes e sensíveis. As cenas se formam na nossa mente como um quadro. Se uma palavra repetida muitas vezes acaba por perder o sentido, o autor faz o caminho inverso.
Sem recorrer ao léxico que já conhecemos sobre a Segunda Guerra, ele constrói um cenário em que a memória coletiva do conflito e suas atrocidades são sentidas de forma visceral, criando uma obra que transcende o tempo e o espaço.
Ao escolher um vocabulário indireto, o autor não só revela a dor e os horrores da guerra, mas também nos convida a refletir sobre a força da linguagem — e como, mesmo sem palavras explícitas, podemos compreender a universalidade do sofrimento humano.
Em uma época em que a literatura parece se esforçar muito para gerar uma conexão imediata com o leitor - se ancorando em lugares, eventos recentes, gírias e até no uso da tecnologia -, é sempre bom encontrar uma obra que nos toca no que é mais universal: o amor e o sofrimento. Independente da época ou do contexto, é isso que continua a falar diretamente com a nossa alma.
Brodeck’s Report é uma leitura que nos desafia a repensar como contamos nossas próprias histórias.
Curtinhas!
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O que eu estou lendo?
Prevejo um período de ressaca literária. Mas, como me propus a ler mais livros em inglês esse ano, e não posso perder o ritmo, vou para o extremo oposto. Na minha cabeceira, The Most of Nora Ephron, me espera feliz. Nora, querida, me faça rir que eu ando precisando!
E não custa lembrar: os livros que eu cito aqui nessa newsletter sempre vêm acompanhados de um link de afiliado da Amazon. Ao comprar qualquer item através desses links, eu ganho uma pequena porcentagem e você não paga nada mais por isso. Vamos ajudar essa produtora de conteúdo a adquirir mais livros e falar mais sobre eles, em um ciclo sem fim de bons conteúdos na internet? :)
Boa dica! Há uma versão em espanhol (El informe de Brodeck). :)
interessante a sinopse do livro. gosto dessas histórias que circundam grandes eventos históricos, mas que tratam de um universo mais particular, um círculo mais íntimo. vou procurar por ele! obrigado pela dica. 😉