Sobre desejos, liberdade e bibliotecárias a cavalo
#60 Zero Pretensões e Sentimentos Aleatórios
Você sonha em ter alguma habilidade secreta? Daquelas que você nunca se mexeu para desenvolver, mas que adoraria ganhar, como num passe de mágica? Eu sonho com duas: cantar (tentei, mas é difícil pra caramba!) e andar a cavalo. Enquanto a primeira pode ser desenvolvida com a ajuda da minha amiga @cantocalu, a segunda demanda tempo, coragem e obviamente, um cavalo. Ou seja, não será nessa vida. E tudo bem.
Mas essa foi uma das coisas que me encantou na história das bibliotecárias a cavalo do Kentucky. Lá pela década de 1930, quando os Estados Unidos passavam pela Grande Depressão, o governo decidiu levar literatura à população, como uma forma de aumentar as chances de conseguir um emprego. A iniciativa ganhou o nome de “Pack Horse Library” e chegou a levar livros, jornais e revistas para 100 mil pessoas em áreas remotas do estado. O programa só terminou em 1943, quando a Segunda Guerra Mundial fez com que os índices de emprego no país disparassem. (No Brasil tivemos algo parecido em 1935, quando Mário de Andrade criou a Biblioteca Circulante em São Paulo).
Eu não conhecia absolutamente nada sobre essa história até ler “Um Caminho para Liberdade”, de Jojo Moyes. Boba que era, eu tinha um certo preconceito com essa autora, muito conhecida por histórias melosas, tal qual “Como eu era antes de você”. E não é que “Um Caminho para Liberdade” não tenha sua dose de romance. É que ele conquista por outros motivos.
Além do poder transformador da literatura, que eu sempre amo ver concretizado em uma boa narrativa, o livro fala sobre a amizade entre mulheres, em uma época em que a rivalidade feminina era uma regra implícita. O casamento, principalmente naqueles tempos, era algo fundamental na vida de uma mulher e pouco se falava sobre as relações de amizade. Mas sem elas seria impossível suportar maridos abusivos, violências diversas e os desafios da vida cotidiana. Sinto que ainda damos pouca atenção a esses laços, mesmo na literatura. O amor romântico acaba sempre ganhando mais espaço.
De volta ao livro, acompanhamos Alice, uma garota inglesa que casa com um milionário americano e vai morar no interior do Kentucky. Quando se vê presa a um relacionamento bem pouco satisfatório, com um sogro abusivo, ela decide se unir às bibliotecárias a cavalo. O grupo reúne mulheres bem diferentes entre si: Margery, a líder, é uma espécie de Jo March, Beth é irônica e durona, com uma energia quase masculina, Izzy é tímida e arredia, e Sophia, a única negra, é responsável por um dos momentos mais tensos da narrativa.
São elas que vão cavalgar quilômetros por trilhas mal sinalizadas nos Apalaches, conquistando a confiança da comunidade e, volta e meia, fugindo de contrabandistas de bebidas (naquela época, a Lei Seca ainda estava em vigor). Mas a carga dramática da narrativa está logo na primeira cena, que só vai fazer sentido lá pelo meio do livro, mudando um pouco o clima do romance.
É leve, é divertido, vai virar filme em breve (a Universal Studios comprou os direitos antes mesmo do lançamento) e merece muito ser lido!
Curtinhas!
Mais sobre as bibliotecárias aqui.
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Ah, e se você tem dificuldade de ler calhamaços, deixei algumas dicas aqui!
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já tinha visto esse livro nas prateleiras, mas confesso que o título e a capa me inspiraram pouca confiança. não sabia que a sinopse era tão interessante.
Ahh que demais ver minha carta complementando as reflexões desse texto 🤎✨
E eu já quero ler Um caminho para liberdade antes de assistir ao filme!