Desde que o mundo é mundo, nós, mulheres, somos classificadas de maneira binária. Somos fáceis ou difíceis. Simples assim, como se nessa classificação coubesse toda a nossa subjetividade.
Quando criança, eu era difícil. Difícil, lá em casa, era quem sabia o que queria e fazia valer seus direitos. Isso só valia para as mulheres, claro. Os homens ganhavam outras etiquetas: eram "determinados" ou "decididos". Quando muito, eram "geniosos". Mulheres tinham o gênio ruim mesmo.
Fui uma menina difícil até entrar na adolescência. Aí eu passei a ser fácil. Fácil a gente sabe bem o que era. Significava puta. Ok, talvez não tivesse esse peso todo, mas era a versão teen da puta, aquela que aparecia na Capricho no topo de uma lista de tudo o que uma menina não deveria ser. Meio termo não havia. Ou era fácil ou era difícil.
Queria que Jout Jout e seu vídeo do batom vermelho tivessem chegado antes. Teriam me poupado muitas lágrimas. Mas foi só por volta dessa época que eu entendi que eu não cabia muito nesses termos. Digo, entendi racionalmente, né? Porque, repetidas ad nauseum, essas palavras colam na gente. E pra descolar, meu Deus, é pior do que band-aid.
Na minha época, legal mesmo era ser "de boa". "De boa" era a menina que não dava trabalho para os pais, "de boa" era a menina que não se incomodava com as besteiras que o namorado fazia, "de boa" era a que realmente não se estressava ou, se estressava, aguentava calada. Eu, decididamente, não era "de boa". Na verdade, eu até aguentava calada, mas lá no íntimo, estava re-vol-ta-da. Tanto que até hoje, mesmo (bem) depois dos 30, meu maior medo social é deixar escapar um pensamento maldoso em voz alta.
O contrário da "de boa" era a chata. E Deus me livre ser chata, gente. Tem coisa pior? Pra mulher não tinha. Só puta. Se bem que puta pelo menos divertia os caras. Então acho que ser chata era pior mesmo.
Vivi agarrada na ideia de não ser difícil durante anos da minha vida. ANOS. E foi só há uns 5, 6 que eu parei pra observar o entorno. As mulheres que eu admirava eram inteligentes, determinadas, espertas, engraçadas, bem-humoradas, generosas. Ou ciumentas, implicantes, detalhistas, arrogantes. Eram tudo, menos fáceis. Pelo contrário. Às vezes eram até chatas mesmo, admitiam e se divertiam com isso. Abraçavam seus defeitos e seguiam em frente.
De todas as minhas amigas e mulheres próximas a mim, nenhuma pode ser considerada "de boa". As que não enchem o saco dos parceiros não o fazem por serem "de boa" (ou "easy going", que eles colocam em inglês pra ver se desce melhor), mas sim porque estão focadas nas próprias vidas. E as que enchem, bem, elas costumam estar certas. Rs.
Delas, eu não queria a suposta tranquilidade. Queria mesmo era a segurança profissional da Lu, o talento da Gabi, a praticidade da Fernanda, a curiosidade e o interesse pelo mundo da outra Fe, a liberdade da Mari, a ousadia da Guta, a generosidade da Clara, a disciplina da Loy, o olhar estético da Ana, a escuta ativa da Ju, a criatividade da Calu, o acolhimento da Nath, a sabedoria da Jo, a beleza (interior e exterior) da Bartira, o maternar da Indi, a força da Dani. Me inspiro nelas todos os dias. Amo todas assim, difíceis como são. Porque nós, definitivamente, não viemos a esse mundo para facilitar a vida de quem nos rotula.
Curtinhas!
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O que eu estou lendo?
Voltei à fase de ler vários livros ao mesmo tempo (sinal claro de ansiedade, só não vê quem não quer!). Na mesinha de cabeceira se encontram: “Pequena Coreografia do Adeus”, da Aline Bei, “Punição para inocência”, da Agatha Christie, “Percy Jackson e o Ladrão de Raios”, do Rick Riordan e “Encaixotando minha biblioteca”, do Alberto Manguel. Digo apenas que Aline Bei vale todo o hype. Dos demais, ainda não sei bem o que achar. Volto em breve com as impressões.
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Que lindo ser citada nessa news que amo <3
Por muito tempo eu fui a chata, por não me contentar com menos do que eu realmente queria pra mim. Esses rótulos nos marcam desde a família até o mundo externo, mas felizmente somos mulheres poderosas que se definem num espectro vasto de cores e personalidades!
Perfeita!! Como me vi nesse texto! Só a gente sabe o quanto os anos da adolescência interferem até hoje, na vida adulta... quantas vezes me peguei calada com um medo antigo de ser taxada de chata, ou de piranha. Só que na vida adulta a garganta começa a ficar frouxa, e ai fica inevitavel não soltar uns rosnados e uns "foda-se" de vez em quando. E ainda bem que a gente solta!! <3